sexta-feira, março 24, 2006

velocidade em potência

há manhãs em que um Homem se sente indestrutível.

não há barulho algum que não aquele causado pelos meus actos. passada forte. abro a porta do carro, entro, ligo o carro, fecho a porta, ponho o cinto, ligo o desembaciador do vidro traseiro, o limpa pára-brisas, as luzes, ponho a primeira, não tiro o pé da embriagem, destravo o carro, mão no volante outra passa pelo cabelo e termina na manete das mudanças. olho intensamente e olho em frente.

o mundo é uma bola pequena mas quando incomensurável essa bola é minha.

o vento faz as árvores abanarem mas só eu causo barulho, tudo está em mute menos eu. a criança que vai pela mão do pai para a escola olha para mim e desvia o olhar assim que se apercebe que eu posso olhar para ela, uma colegial ao observar tamanha força deixa cair o telemóvel que estava a usar e o balão rebenta-lhe na cara.pestanejo uma vez, e durante o pestanejamento em si viro a cara para a minha esquerda sendo que no final do mesmo e ao abrir os olhos, digo em tom grave

-"achas mesmo que me podes parar?"

a resposta vem do meu lado direito
-"não te esqueças que tens de ir pôr gasóleo e já estamos atrasados".

um gajo já nem pode brincar.

segunda-feira, março 20, 2006

maria, grávida e em fátima

fui andar de kart na pista de fátima.

como nunca tinha conduzido um encarei a coisa com o optimismo inocente de quem não sabe onde se está a meter.

mas eu deveria saber que nestas coisas existem sempre pequenos sinais, pequenos nadas que no fim decidem sempre as coisas contra nós.

inicialmente as coisas até pareciam bem encaminhadas. o meu kart era o número 4, o meu nº preferido.

mas a partir daí foi sempre a descer.

assim que saí das boxes e antes de entrar na pista o primeiro sinal, o motor foi-se abaixo, depois vieram uma catadupa de sinais, a viseira do meu capacete partiu-se em plena grelha de partida, o meu carro não travava, o meu jeito natural para não conduzir kart ao longo de toda a prova foi ganhando proporções estupidamente estúpidas, chuva intensa, uma nuvem que me seguiu durante toda a corrida, pista estreitinha, estavamos a conduzir em fátima e eu tive de ultrapassar por duas vezes uma grávida de seu nome Maria, não fui o único que o fez mas era o único que gritava "não andas nada ó gorda!".

no final fui o último dos homens, e fiquei à frente de todas as mulheres com excepção de uma (aquela que não desistiu), enfim, um honroso 15º lugar na geral.

eu poderia justificar o meu lugar não-pódio com n coisas mas vou apenas falar em 14.

1-estava a chover o que a pilotos com o género de condução agressiva como a que eu tenho complica as coisas.

2-o meu chefe participou

3-o meu chefe levou um fato especial para a prova, um fato impermeável por cima do especial, um capacete próprio e umas botas próprias

4-dispendi muita da minha energia a tentar convencê-lo de que se ele também se estivesse a rir então as pessoas não estariam a rir dele mas com ele.

5-o meu chefe ficou em pnúltimo

6-há uma hipotese de promoção no meu departamento

7-graças a Deus fiquei em último. (no final da prova ainda tive de exclamar e de forma completamente espontânea e efusiva para o "fitipaldi" que coordena o meu departamento "e dizia você que não tinha jeito!"

8-média de 9,3 peões por volta, tudo por causa da maldita chuva.

9-condutores mais rápidos.

10-pista muito mal desenhada com claro excesso de curvas

11-na primeira volta despistei-me e saí de pista.assistente de pista rapidamente dirige-se para o meu kart e coloca-o dentro de pista

12-na volta seguinte a mesma coisa na mesma curva. novamente o assistente de pista rapidamente dirige-se para o meu kart e coloca-o dentro de pista

13-duas voltas depois voltei à carga e na mesma curva, gravilha com ele, só que desta vez e para espanto de todos o cavalheiro que supostamente me teria de ajudar a tirar o carro em vez de vir
a correr fez umas trombas do tamanho do mundo e não obstante estar a chover intensamente preferiu vir a andar lentamente em direção ao carro em vez de correr, esta atitude completamente anti-desportiva fez-me atrasar de forma irremediavelmente, enfim, atrasada, em relação aos outros condutores.

14-ao contrário da x-box e do saudoso 48k não podia desligar/voltar a ligar e dizer "pronto, aquela não estava a contar, agora é que é".

segunda-feira, março 13, 2006

uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa

descobri no outro dia que a distância que vai daqui p'ráli e dali p'ráqui depende de muito mais coisas que da distância em si.

depende por exemplo de quem se esqueceu do sítio onde deixou o carro, pode depender também de quem teimou por onde outra pessoa entrou no centro comercial e pode depender também de humor da altura, mas raramente a distância entre o ponto A e o ponto B é medida em unidades de comprimento.

testemunhei isto no outro dia quando, e num momento raro de esquecimento da minha pessoa mas raro mesmo, em que eu ia jurar que tinha estacionado o carro num sítio e quando me dirigi para ele reparei que estava no extremo oposto do parque.

ao verem-me atravessar o parque todo na diagonal, lá estavam os tipos da segurança do parque com os impropérios habituais de "lá 'tá a andorinha outra vez à procura do carro,... devias deixar um rasto de migalhas até ao carro!... totó...".

normalmente neste tipo de situação em que sou provocado costumo responder de forma bastante agressiva, sei que é um defeito mas não consigo conter a raiva e parto logo para a violência.

como nesta situação eu não estava dentro de um carro em fuga, perdão em andamento, e as pessoas em questão tinham mais de 8 anos optei por mostar toda a minha classe ignorando tais palavras e olhando para o chão enquanto passava por eles.

claro que isto não foi o pior. o pior foi que desde o momento em que disse "não me lembro muito bem onde deixei o carro.." ainda dentro do centro comercial, até chegar a casa depois de uma viagem de 30 minutos, estive sempre a ser "elogiado" pela pessoa que estava comigo (pessoa muito inteligente e bonita e... não digo isto porque sei que ela vai ler este post mas sim por ser aquilo que sinto).

aqui vão alguns exemplos das frases ditas enquanto descíamos a passadeira rolante
-"tu és incrível"
-"nunca conheci ninguém como tu"
-"deixa lá, eu às vezes também me esqueço das coisas"

aqui vão outros exemplos de frases ditas mas desta vez assim que acabou a passadeira rolante e a menina teve realmente de andar
-"eu não acredito nisto!!!"
-"vou comprar-te uma bússola!"
-"totó.." (nesta situação apercebi-me do quão reconfortante é sabermos que a pessoa que está connosco não está só...)

ao fim dos primeiros 100 metros lá veio o mais ou menos aguardado
-"fdx!"

ora, a questão é que neste fim-de-semana, aconteceu que eu deixei o carro exactamente no mesmo sítio mas alguém (não vou dizer quem pois esse pormentor não é importante para a estória, pois não amor?), teimou em irmos para o parque por uma determinada passadeira rolante.

sim era a mesma da outra vez, sim a distância era a mesma, sim lá estavam os senhores que guardam o parque.

no entanto a reação foi um pouco diferente.
desta vez ao ver onde estava o carro apenas se ouviu em tom entusiasmado, como quem acaba de beber uma coca-cola num dia quente de verão
-"olha amor, está já ali o nosso carrinho!"

segunda-feira, março 06, 2006

peta-zetas, a solução para o desconforto social


mudei provisoriamente de função no meu local de trabalho devido a um problema de saúde de uma amiga e colega (a ordem é mesmo esta e fiquei com essa certeza quando no outro dia falávamos ao telemóvel e disse-me que estava na casa-de-banho, ora eu só falo ao telefone quando estou nesse local de esforço com pessoas que gosto).

tive de substituí-la nas suas tarefas e fui desterrado para um local onde durante o dia não tenho que dizer mais do que 4,5 palavras (todas elas monossílabicas, ditas praticamente com a boca fechada e sem esboçar qualquer emoção que não seja a total indiferença).

como não sou um gajo de muitas falas, ao início até pensei que seria suportável, agradável até.

é que ao longo da minha vida, sempre mostrei ter um jeito muito especial para não conseguir ter qualquer conversa de circunstância.

aliás tenho a clara sensação que se um dia eu salvar a vida a alguém, vamos supor, retirando uma pessoa de um edifício em chamas, voltando para lá para salvar a filha e a mãe, e essa pessoa no final me abraçar enquanto chora compulsivamente e dá como dado adquirido que eu fui um anjo enviado por deus para a salvar, grita "você salvou a minha vida, você salvou a minha vida", eu possivelmente não retiraria as mãos dos bolsos, não faria qualquer expressão facial, nenhum gesto, nada, no máximo diria "ok" seguido de um muito seco "com licença".

apesar disto, eu simplesmente não suporto o local onde provisoriamente estou neste momento a trabalhar e só espero que como tudo o que é provisório isto não deixe marcas para o resto da vida.

pensei até que a semana que passou seria a última em que iría conseguir manter alguma sanidade mental... mas num instante tudo mudou.

um momento de magia, o regressar à infância (ou adolescência não sei bem) e naquele instante eu senti "agora sim tenho a certeza que por mim o mundo pode acabar amanhã.

é que no no sábado eu comi... PETA-ZETAS!!!!!!lembram-se???